domingo, abril 15, 2007

Pavão "Reloaded"

Não foi consensual a minha posição acerca do uso dos linhos, algodões e fibras de polyester.
Especialmente na comunidade feminina, mais vulnerável à exposição física. Penso ser necessário clarificar alguns dos pontos de vista, para tentar que pelo menos a consciencialização da necessidade prática da mudança de mentalidades, faça ricochete na caixa craniana dos que intelectualmente me apedrejam.
Não me quis alongar demasiado na anterior exposição, para não desvirtuar com detalhes técnicos menores, todo o conceito subjacente ao uso do fato integral. Primeiro erro grosseiro... Para as mulheres, a coloração ou padronização, nunca é um detalhe menor. Arrisco-me a dizer mesmo que é O detalhe... (Ok... vou parar com o ataque à classe... mas que me estava a divertir... o sorriso estampado na minha face não o consegue negar!)
Muito bem... a ideia é utilizar materiais que possuam a capacidade de reflectir todo o espectro cromático, capazes de reter e utilizar informação e um sistema central que coordene todo o processo. Nano-escalas... pois claro!
Tanta tecnologia para agradar... e com a certeza de não mais subestimar o factor decorativo, mas também ocultativo ou simulativo das vestes.
Traduzindo então a tecnologia por miúdos... imaginemos que caminho, numa noite de lua nova, na berma de uma estrada... que jeitaço me dá uma coloração laranja fluorescente. Já para os ornitólogos, que bom ter uma camuflagem específica para cada terreno, de modo a não amedontrar os objectos de estudo. Ou ainda, ao sabor da imaginação infantil, poder ser o Super-Homem, o Batman ou o Homem-Aranha (que, como todos sabem, é primo do Homem-Salsicha!). Por último, para quem gosta de se exprimir pela coloração ou padronização do que veste, imaginem as possibilidades virtualmente infinitas de todos poderem ser os seus próprios estilistas, e de se tornarem criadores, ao invés de escravos da moda... tudo ao alcance de uma ferramenta informática que possibilitasse a transferência de informação de e para o fato.
Agora, o lado verde! E não, não é um versão personalizada para o Sr. Paulo Bento. Refiro-me à vantagem ecológica do equilíbrio térmico corporal poder ser mantido sem o recurso a sistemas de aquecimento ou de refrigeração do ambiente, com todas as vantagens ecológicas que isso acarreta (diminuição das emissões de dióxido de carbono para a atmosfera, poupança energética e preservação dos recursos não renováveis do nosso planeta). Concordam que seria um desperdício tentar aumentar a temperatura da água de um rio, para que o nível de conforto corporal de quem desejasse observar a fauna e flora subaquática pudesse ser mantido em valores aceitáveis, e não se corresse o risco de entrada em hipotermia. Foi muito mais simples inventar um fato de mergulho, actuando directamente no indivíduo, sem ser necessário alterar todo o meio envolvente. Parece lógico, não é?
Então, porque não fazer o mesmo com o ambiente gasoso, se faz tanto sentido fazê-lo com o líquido?
Fazendo mais ou menos sentido tudo o que acabei de dizer... não esqueçam nunca que foi sempre o raciocínio, o principal motor de desenvolvimento humano. Se todos nascermos, crescermos e morrermos sem questionar qualquer dos valores instituídos para cada época, a geração seguinte será rigorosamente igual à anterior, e entraremos numa perigosa espiral de estagnação. É fácil deixar para os "cientistas" a responsabilidade de abrir as portas da evolução. Nesse caso, como qualificar os restantes?...
Resignados, respondo eu!!
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Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito.
Albert Einstein
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Três dias para o nosso menino fazer cinco anos... quase um Homem!
Um beijo,
Afonso Gaiolas

sábado, abril 14, 2007

Penas de pavão ou pena dos pavões!

Tarde de sábado de alerta, num dia atípico para a tradição belga. Vinte e sete graus Celsius e um sol de fazer inveja à reputação mediterrânica de paraíso balnear.
Um pavão passeia-se, ora à esquerda, ora à direita do cinescópio, a dois metros da minha poltrona. É impossível ficar alheio à euforia colorida e à beleza natural dos seus adornos. Enfim... não encontraria melhor exemplo para definir a expressão... pavonear-se!
Baixo os olhos para me perder na imensa monotonia de verde-azeitona do meu fato, e não deixo de me sentir diminuído no índice potencial de captação de fêmeas.
Será que é apenas disso que se trata, no caso dos humanos? A discussão é mais profunda do que parece...
Já passei por todas as fases, da inocência da nudez natural, à adolescência tribal, pela acomodação à filosofia do vestir despreocupado e, por defeito de profissão, à uniformização pura e simples.
Sinto-me confortável, portanto, para qualificar os trapos que diariamente me (nos) cobrem.
Podia começar com uma frase do tipo, "No princípio era a nudez", e por aproximação à bíblia e à evangelização do mundo, tentar demonstrar que a religião teve um papel preponderante no envergonhamento global. Malditas tribos que ainda não se cobrem, que não conhecem o decoro e a discrição, e que não se ralam nada com isso... Imagino onde arderão de tanto pecado junto...
É óbvio que o pensamento é redutor, mas não retira ao credo religioso uma enorme fatia de responsabilidade no assunto. (Porque é um defeito e não uma virtude, que ninguém tenha dúvidas disso!)
Mas se o tiverem, tentem perceber um dia o ponto de vista do decoro e da discrição de quem vê o mundo pelo rendilhado da veste que representa um dos mais elevados graus de degradação da condição feminina.
Mas nós estamos tão avançados, dirão... que até o lencinho na cabeça já condenamos...
É só pousar a mão na consciência e perceber o nosso lugar na sequência de eventos, e o grau de culpabilização de cada um. E com que idade iniciamos as novas gerações nessa culpabilização.
Tudo depende, no fundo, de que lado recebemos a luz decomposta pelo prisma... e, mais importante que isso, de quem nos fornece a luz!
Mas, assumidas que estão as vestes que escondem, como naturalmente estarão as vestes que protegem... quero debruçar-me sobre as vestes que decoram.
o mundo da moda é de uma natureza desconcertante. Mas não tanto quanto a mentalidade vigente. Vivemos um tempo em que todos procuram o graal da individualidade, ainda que cada vez mais iguais a todos os demais. Só assim se explicam os obscenos monopólios de meia dúzia de marcas, que regem a consciência grupal do que é aceitável ser exibido a cada ano que passa.
Gostava de ultrapassar isto e focalizar-me no efeito protector, mas há um risinho interior que me impede. A galhofa de imaginar a maior parte das peças do nosso guarda-roupa é mais forte do que eu. Mea culpa também, porque também eu, de quando em vez, faço uso da tira de tecido opressora do pescoço, que dele pende ociosamente e que tanto uso pode ter no dia-a-dia de um ser humano, com um sem número de aplicações que agora não me consigo recordar...
E escuso de avançar para o vestuário feminino...
Se ao menos as pessoas fizessem o exercício de estilo de se colocarem na pele dos seus trinetos, em idade adulta, a admirar a figura dos trisavós, nas suas bizarras vestimentas...
Para além de todo este conceito subjectivo de beleza, o que defendo é que apontemos baterias ao alvo correcto, ao invés de desperdiçarmos potencial cerebral em ressuscitar, a cada 30 ou 40 anos, as roupas que então fizeram furor nas pistas de dança ou salões de baile.
É chegada então a hora da sujeição aos comentários jocosos dos criadores de moda, que pensarão "Olha-me este com a mania de imitar os livros de qualidade duvidosa de ficção científica". Curioso seria demonstrar quanta da ficção científica do passado se tornou na realidade actual (e que bem calçado que estou se me lembrar do senhor Leonardo di ser Piero, vindo da pequena localidade de Vinci, ou ainda de Júlio Verne, de um tempo onde já não era importante saber-se de onde se vinha).
Pois bem, o meu ideal de vestuário passa por uma única peça, integral, ajustável ao corpo como uma segunda camada epidérmica (entram em cena os apupos dos detractores da exposição da excessiva gordura corporal, especialmente se da mesma forem fiéis depositários), tão ou mais flexível que a versão orgânica, isotérmica e exteriormente estanque, mas permeável à transpiração e respiração cutânea, com um índice imaculado de protecção contra o espectro de radiação electromagnética que a nossa atmosfera começa a ter dificuldade em filtrar, contra a oferta de Prometeu aos Homens e contra as agressões potenciais de vértices afiados dos diversos elementos sólidos do nosso corpo celeste.
Seria deselegante se esquecesse a capacidade de suporte às partes do corpo mais sujeitas à acção impiedosa da gravidade e a facultação da invulgar característica que Grenouille, personagem maior da imaginação de Süskind, tentou sordidamente ocultar.
Impressionante caderno de encargos, bem sei, mas ainda assim não tenho a certeza de ser tão eficaz ou útil para o mar de doutores e engenheiros do nosso país como o fiel binómio fato-gravata numa tarde de Verão.
Todo este devaneio perde, no entanto, todo o sentido se descontextualizado do ideal subjacente, a tradução da mais básica das "verdades de La Palisse". Cada corpo é único e é essa individualidade que merece ser realçada, não uma qualquer demonstração de riqueza na forma de símbolo representativo de um criador de moda. Talvez assim a naturalidade voltasse lentamente a morar paredes meias com a beleza, e abandonássemos a idiotice de tentar concorrer com o protagonista animal da minha excitante tarde de sábado.
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Saudades,
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Afonso Gaiolas

domingo, abril 08, 2007

E nunca Querer sem Poder

Foi lançada recentemente uma campanha televisiva de promoção da marca Adidas, com uma frase a servir de porta-estandarte, que ecoa no meu subconsciente de cada vez que a leio, no final de cada sequência de imagens do anúncio.
"Impossible is nothing", do original em Inglês. Invencibilidade, como eu secretamente sempre gostei de lhe chamar.
Este sentimento, que não representa qualquer fenómeno competitivo com outros seres humanos, regeu a minha maneira de encarar o mundo durante quase trinta anos. Foi a época de ouro desta mole de células, no que à actividade física diz respeito. Não é fácil explicar este sentimento, a quem nunca a ele teve acesso. Penso que a melhor ilustração reside no exemplo, chegado hoje do rio Amazonas, atravessado em toda a sua extensão, a nado, por um ser humano, em pouco mais de dois meses. 99,99% dos espectadores do telejornal ficaram atónitos pela inverosimilhança de tal proeza. Mas 0,01% pensaram... quanto tempo disponível para treinar a cabeça e o corpo? Não se trata de fanfarronice... longe disso... apenas na tradução da frase do anúncio.
A invencibilidade que mencionei há pouco, reside na vitória permanente sobre o "eu" obscuro que povoa a nossa mente, e que nos impele a parar sempre que exigimos algum esforço maior sobre o nosso corpo; reside na sensação de tudo podermos, se assim o desejarmos.
Cometi algumas extravagâncias (aos olhos da sedentária maioria) durante estes anos, sem mediatismo nem visibilidade, por apenas querer demonstrar a validade desta teoria, pelo prazer inenarrável desta sensação.
Escrevo isto hoje... porque começo a sentir que a palavra que me serviu de armadura contra os mais rebuscados desafios me foge sob os pés, por me lembrar dos jogos de futebol sem relógio, das corridas sem destino, da apneia intemporal, das braçadas, do rolar das rodas dos patins e da bicicleta... sem cansaço. Mesmo quando me afastava de tudo isto por algum tempo, sabia que num estalar de dedos tudo voltaria ao normal, mas agora... já não tenho a certeza de o conseguir novamente.
Não é o corpo que me atraiçoa... sei que ainda tenho muitos bons anos de força pela frente... foi a cabeça que se esqueceu de quem manda em quem. E o demónio que expele o ácido láctico, sopra agora também a névoa que corrói a vontade de cumprir as três latinas palavras que reflectem o espírito olímpico. E é tão mais difícil derrotá-lo que à mais alta das escarpas...
Diz-se que as crianças têm muito vigor, que é impossível acompanhá-las nas brincadeiras, que não sabemos onde vão buscar tanta energia... mas a verdade é que à noite caem exaustas e, não raras vezes dizemos... "coitadinhos... estavam cansados... pudera, brincaram o dia todo".
Será que as campainhas não tocam quando ouvimos as palavras que nos saem da cavidade bucal? Não se ruborizam as faces de tanta bofetada de luva branca? Tanto mais, porque vindas de quem pouca consciência tem da complexidade do mundo!
A energia que possuímos é um bem esgotável, é verdade, mas com a idade deixamos de ter, paradoxalmente, consciência de quão fundo é o poço que a alberga. As crianças, por seu lado, nem se preocupam com isso, porque a vontade de brincar move a mais pesada das montanhas (embora se possa uma ou outra vez ouvir, mas por razões mais perversas... "mas assim o Alexandre fica cansado!").
Esta é uma batalha pessoal, que muitas pessoas perderam sem nunca sequer se terem apercebido de ter travado, e que se reflecte na maneira conformada de olhar o mundo, de um viver autómato, que embaraça se mencionado... e por isso negado pelo esvaziamento filosófico individual.
E eu, que me arvoro em campeão da astúcia no reconhecimento da subliminaridade do marketing e da publicidade, fico com vontade de comprar mais um par de sapatilhas!
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"Jamais o sol vê a sombra"
Leonardo da Vinci
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Afonso Gaiolas