segunda-feira, março 07, 2005

Falta-nos a água ou a omnipresença?

Foi tão grande o júbilo pela recepção de tantas e tão efusivas mensagens de contentamento pela abertura deste espaço de meditação que não caibo em mim de contente. Bem, na verdade apenas recebi duas, e suspeitas por sinal... Mas enfim, se buscasse a glória e a fortuna teria enveredado por uma carreira que me permitisse mandar calar os adeptos das equipas adversárias em pleno estádio, anunciar aos sete ventos que sou o melhor do mundo, e ainda assim ver ofuscada a arrogância da atitude e enaltecida a qualidade máscula de tão viril proeza.
Adiante!
Durante este interregno, questionei-me acerca do tema sobre o qual mais me agradaria (desculpem-me o egoísmo) dissertar. Depois de muito reflectir, e apesar de saber o quanto movediças podem ser as areias que estou prestes a pisar, decidi que valia a pena o risco da exposição, perante a grandeza do assunto.
O tema, retratado no título que resolvi emprestar a este aglomerado de palavras, é tão só o que mais arrastou o pensamento e as vontades do bicho Homem ao longo dos séculos... a religião.
É tão ou tão pouco controverso, que não estando mais de meia dúzia de inócuas palavras escritas neste pequeno texto, já as mesmas provocavam uma acesa e animada discussão entre mim e um excelso interlocutor, que casualmente (ou talvez não), sobre o meu ombro as leu "na diagonal"!
O brilhantismo com que defendeu a sua dama, que rapidamente se transformou em moinho de vento, e depois em terrível demónio, ao sabor do interesse comum deste ou daquele assunto mais esotérico, leva-me quase a adiar pelo cansaço, a dissecação do tema a que me propus. Mas para não defraudar aqueles que, por me saberem sozinho e com tempo de sobra para a ilustre actividade literária (desde que determinada campainha não soe), esperam um produto palpável resultante desta noite, farei um pequeno esforço, que espero terminar antes que comece o período de "televendas" da grelha televisiva!
Falta-nos a água ou a omnipresença?
Assisti hoje com alguma letargia ao principal noticiário do canal estatal de Portugal, por três quartos de mim estarem longe (não muito), mas o suficiente para o desconforto ser imenso. Não pude, no entanto, deixar de focalizar toda a minha capacidade de processamento para o que, não muito longe da minha terra de eleição, se retratava, na forma de reportagem barata, sem o mais pequeno laivo de brilhantismo ou qualidade jornalística. Pedia-se, nada mais, nada menos, que a Deus, a divina concessão da queda de algumas moléculas de hidrogénio e oxigénio interligadas (já agora, pois pedir não custa, que viessem na proporção do dobro das primeiras em relação às segundas) por aquelas paragens. Como gostamos sempre de dar algo em troca, fazem-se novenas, organizam-se procissões e rezam-se missas, tantas quantas necessárias até que as ditas desabem em catadupa por esse firmamento abaixo.
Não me chocam os alicerces que as pessoas construam para anular o medo da morte, a sensação de inutilidade perante a ausência de Objectivo de vida, o receio do desconhecido, o sentimento de pertença a uma tribo/comunidade, ou tão somente o desejo de seguir na "carneirada". Não tenho sequer pretensões a influenciar quem quer que seja, pelo simples facto de não conseguir provar o que quer que seja (pois é... sobra a fé, dirão vocês), mas eu digo que devemos parar para pensar um pouco. Parece inocente este pedido genuíno das populações, numa altura de aflição. Longe de mim desdenhar dos sentimentos de cada um, mas, e a omnipresença? Será que Deus estaria descansado a olhar para o lado, que não viu que passou quase um ano desde que ordenou que a chuva caísse por estas terras? Não podia ser, pois é omnipresente. Concerteza não se esqueceria. Estará a castigar-nos pelos actos irreflectidos que temos ao longo da nossa existência diária? Não pode ser, pois pelo seu carácter infinitamente bom, seria incapaz de castigar o todo, pelos deslizes de uma pequena/grande parte. Ainda podem argumentar que é tudo consequência do livre arbítrio e da ausência de interferência que Deus nos concedeu. Pois, mas se assim é, que injustiças cometerá em conceder determinadas excepções àqueles que mais suplicarem?
Tudo isto para que conclusão?
Preferiria que, na minha terra, ao invés do tom monocórdico e previsível dos ritos religiosos, se escutassem nas assembleias municipais, nas assembleias de banco de jardim, ou mesmo nas assembleias de balcão, os tons polifónicos das discussões acerca das melhores medidas a tomar para minorar os tempos de agrura com que a natureza nos brindou.
Por um lado choramos (mal, porque gastamos água, ainda que ligeiramente salgada), mas não dispensamos a lavagem do nosso bem amado automóvel, que estará sempre mais reluzente que o do vizinho. Nem restringimos a rega dos jardins públicos ou privados, pois isso também já é um exagero que roça os limites do ridículo.
É certo que muitas medidas devem partir do poder central, mas é preciso vencer a inércia e tomar consciência da necessidade de agir também localmente, ao invés de cumprirmos o mito alentejano da eterna inactividade física e intelectual.
Agora pensam vocês, está este marmanjo aqui com esta conversa toda, queira Deus, não chova já amanhã, e acaba-se já a razão para este paleio todo. Ainda que assim fosse,teria servido para criar aquilo em que há muito deveríamos já ter pensado - planos de contingência. Planos que, ao invés de tentar remediar a desgraça inevitável, nos permitissem precaver contra uma situação potencialmente preocupante.
Teremos seca extrema? Em Abril haverá águas mil?
Nem a Maya sabe a resposta.
Entretanto, continuamos a rezar, na esperança de que tudo se resolverá pelo melhor.
Basta que Deus ouça as nossas preces... ou não.

3 comentários:

Anónimo disse...

Obrigado por este contributo e que continues com muito sucesso nesta "blogosfera". Pensa, reflecte e exterioriza. Força aí!Estamos contigo.
Pedro e São

Anónimo disse...

Afinal hoje não choveu! Pelo menos em terras de saloios, o sol apesar de amedrontado, espreita destemido!
Para todas as primeiras experiências da vida, elevamos as nossas expectativas, e para esta admito que não foi excepção, no entanto, dou a mão à palmatória, pois o tema escolhido para a minha primeira experiência na blogosfera parece-me estar à altura, até bem alto por sinal, que não se vê, apenas com fé se pode sentir entre algumas gotas de chuva!
Pensamos todos, o quão evoluído somos, criticamos até os que não o são, e realizamos cimeiras para os ajudar, no entanto basta olhar ao redor e ver como tão mal gerimos um recurso tão precioso! Como é possível utilizarmos água potável para rega de campos de golfe só para ver satisfeitas as necessidades dos mais caprichosos.
Mas dirão, os caprichosos não terão direito de usufruir de uma boa “tacada”? Claro que sim, mas os m3 de água potável gastos para rega de um campo de golfe poderiam ser geridos de forma mais eficiente, se utilizados os m3 de água produzidos pelas ETAR’s (para os menos familiarizados com sigas – Estações de Tratamento de Águas Residuais) que supostamente esse tipo de infra-estruturas é obrigado a ter!
Para os mais cépticos que poderão contrapor alegando problemas da qualidade das águas provenientes das ETAR’s para esses fins, posso facultar uma lista de contactos que com toda a certeza estão à altura para solucionar problemas, e simultaneamente contribuir para a diminuição da taxa de desemprego que tantos políticos querem ver anulada.
Poderia referir inúmeros exemplos como o supra citado, no entanto tornar-me-ia exaustiva com as potencialidades que a tecnologia já nos proporciona para a reutilização de águas, mas que teimamos em não aceitar, não sei porquê? Comodismo? Pressões económicas? Talvez esta última, mas tenhamos capacidade de reutilizar, e ensinar talvez, que ao reutilizar estamos a poupar recursos financeiros!
A seca não é um problema novo e frequentemente assistimos a autarcas a opinar e a solicitar subsídios perante as câmaras televisivas, no entanto o “pano de fundo” da reportagem é o jardim que pelas três da tarde está a regar! É necessário uma tomada de consciência, e de forma sustentável gerirmos os recursos naturais, que por muito queiramos controlar, seremos sempre submissos à mãe natureza.
Relacionar Deus com capacidade de chover, também não me parece aceitável, é verdade que o ensinamento da imensidão do amor de Cristo por nós, não permite que pensemos Ele nos faça sofrer.
Ter fé não é necessariamente esperar que Deus nos ajude, até porque nunca fizemos nada por Ele! Ter fé é algo mais superior que um conjunto de crenças e orações, não é com demonstrações para “Deus Ver” que seremos restituídos!
Ter fé é apenas somente isso…fé. A fé não se discute, ou se acredita ou não!
Deus queira que chova!
JONH 3:16

Anónimo disse...

Dar forma a um pensamento e partilhá-lo com os outros nem sempre é uma tarefa fácil. Por isso, é com alguma relutância que imprimo às teclas do computador um cunho pessoal e entro neste mundo (que, para mim, é completamente novo), na esperança de que a minha modesta opinião possa contribuir para alicerçar novas ideias numa coisa tão inconstante como é o pensamento humano.
A questão da religião e da fé (ou da falta dela) parece-me de menor importância face ao período conturbado em que vivemos, quer à escala nacional, quer à escala internacional. Correndo o risco de parecer demasiado redutora, penso que a Humanidade há muito esqueceu o factor comum da espécie humana: a sobrevivência! Por isso, porque vivemos demasiado ocupados e preocupados com o nosso próprio umbigo, tentando a supremacia por vias tão inválidas quanto violentas, é que nos deixámos chegar ao ponto em que chegámos.
Não querendo parecer trágica ou melodramática (mas correndo esse risco de forma consciente), não deposito grandes esperanças no futuro, até porque não acredito em Deus. Acredito, sim, no valor humano, que precisa ser desencarcerado em todos nós para que, de uma vez por todas, acordemos do pesadelo em que transformámos o planeta azul e nos voltemos a lembrar que a união faz a força e que todos juntos valemos, sem qualquer sombra de dúvida, muito mais do que cada um por si!
Mimicha